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Turquia e Egito: Amigos de Novo?



Embora o Egito e a Turquia estejam ligados por fortes laços religiosos, culturais e históricos, as relações diplomáticas entre os dois países enfrentaram diversas tensões ao longo da história. No século XX, durante a Guerra Fria, quando o Egito se encontrava sob o governo do presidente Gamal Abder Nasser, os laços entre esses dois países foram enfraquecidos devido à fundação da Organização do Tratado Central (CENTO, sigla do inglês Central Treaty Organization) em 1955, também conhecido como Pacto de Bagdá uma aliança militar entre Irã, Iraque, Paquistão, Turquia e Reino Unido. Gamal Nasser viu o surgimento dessa organização como uma grande ameaça aos seus esforços para eliminar a influência ocidental no mundo árabe e ao crescimento da sua ideologia pan-arábica, o Nasserismo. Ao longo da história, várias outras questões também contribuíram para o aumento das tensões entre Egito e Turquia. Em 1958, o Egito entrou em uma breve união com a Síria, vizinho do sul da Turquia com quem o país compartilhava disputas diplomáticas e fronteiriças de longa data. Isso resultou em graves tensões entre os dois países, com a Turquia respondendo com seu envolvimento em uma "aliança periférica" ​​secreta com Israel; a Turquia foi o primeiro país islâmico a reconhecer a legitimidade do Estado de Israel que, na época, era um dos principais rivais do Egito. Esse conflito diplomático não teve maiores resultados, mas marcou os dois Estados.

Mais recentemente, em 2013, o atual presidente egípcio, Abdel Fattah el-Sisi, mais conhecido como General Sisi, liderou um golpe de Estado no Egito cujo principal objetivo era remover o então presidente, Mohamed Morsi, do poder. Morsi era um ex-líder da Irmandade Muçulmana, uma organização islâmica radical que atua em cerca de 70 países e que pretende "retomar" os ensinamentosdefende uma interpretação e aplicação estrita do Corão, rejeitando qualquer tipo de influência ocidental; além disso, ele também era fortemente apoiado pelo Partido da Justiça e Desenvolvimento da Turquia (AKP, sigla do turco Adalet ve Kalkınma Partisi), levando ao surgimento de tensas relações entre o recém nomeado governo interim do Egito e o governo de Recep Tayyip Erdogan na Turquia. O bem-sucedido golpe de Estado no Egito incidente resultou no recall dos embaixadores de ambos os países e foi recebido condenado com várias agressões verbais depor Erdogan, que descreveu o evento como "antidemocrático" e se referiu a ele como um "massacre", enquanto sugeria que os líderes do Egito deveriam ser submetidos a um "julgamento justo e transparente." Desde então, as relações diplomáticas dos dois países sofreram rebaixamento, quando os embaixadores de ambos os países foram chamados de volta e a missão diplomática respectiva foi conduzida por um diplomata de hierarquia inferior. as relações diplomáticas entre Turquia e Egito foram praticamente inexistentesO incidente e as consequências não mudarma o quadro político no Egito, e e Abdel Fattah el-Sisi permanece no poder até hoje. Em 2017, a rivalidade entre os dois Estados foi novamente reafirmada quando a Turquia ofereceu apoio ao Catar, após a Arábia Saudita, o Egito, os Emirados Árabes Unidos e o Bahrein cortarem os laços diplomáticos com o país, sob a suspeita de seu envolvimento em atividades terroristas. Esses quatro governos impuseram um bloqueio aéreo, marítimo e terrestre ao Catar, com diversos outros países seguindo o exemplo. No entanto, em 2023, os dois Estados demonstraram interesse em restabelecer as relações diplomáticas. De acordo com Mensur Akgun, professor de Relações Internacionais na Universidade Kultur de Istambul, “os dois países entenderam que não é possível mudar um ao outro” e também chegaram à conclusão de que é melhor “priorizar e proteger os interesses dos dois lados da região”. A reaproximação deu-se a partir de 2020, quando Erdogan expressou sua intenção de elevar a diplomacia turca e aumentar a influência do país na região. Nesse contexto, um entendimento com o Egito se tornou crucial, pois a falta desse acordo poderia minar algumas das opções externas de Ancara, abrindo espaço para a concorrência regional. Funcionários dos Ministérios das Relações Exteriores de ambos os países têm mantido conversas desde 2021, e os esforços de aproximação entre Turquia e Egito ganharam impulso após um encontro entre Sisi e Erdogan durante o Campeonato Mundial de Futebol no Catar, no final de 2022. Esse encontro foi visto pelos analistas como um passo importante, pois Erdogan, que anteriormente havia excluído Sisi de sua agenda política, teve de dar o primeiro passo, mostrando abertura para deixar as suas divergências para trás. A Turquia e o Egito deram um passo significativo ao trocar embaixadores pela primeira vez em uma década, o mais recente sinal de um aquecimento das relações diplomáticas. Em comunicado conjunto divulgado pelo Ministério das Relações Exteriores turco, os dois governos relataram "melhores relações diplomáticas" entre os dois países, com a Turquia nomeando Salih Mutlu Sen como seu embaixador no Cairo e o Egipto nomeando Amr Elhamamy como seu enviado a Ancara. “Este passo visa a normalização das relações entre os dois países e reflete a vontade mútua de melhorar as relações bilaterais no interesse dos povos turco e egípcio”, diz o comunicado. Entretanto, é importante ressaltar que o restabelecimento das relações diplomáticas não significa necessariamente que as duas capitais mediterrânicas estejam totalmente alinhadas em questões como a partilha de recursos de hidrocarbonetos no Mediterrâneo Oriental, o conflito na Líbia, a guerra na Síria e a crise diplomática no Golfo, que eram alguns dos principais pontos de discórdia entre a Turquia e o Egito. É notório que a recente reaproximação entre esses dois Estados faz parte de uma estratégia mais ampla do governo turco para construir pontes e fortalecer relações com os países da região, como mencionado anteriormente. A Turquia busca encerrar seu isolamento internacional e reforçar sua posição diplomática, especialmente diante dos desafios econômicos que enfrenta. Ela, mais recentemente, também restaurou seus laços com Israel, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos. O fato de duzentas empresas turcas estarem atualmente investindo no Egito, com um valor equivalente a US$64 milhões, indica um interesse crescente na expansão das atividades econômicas entre os dois países. Esse investimento pode contribuir para o crescimento econômico e a geração de empregos em ambos os países. Além disso, é digno de nota que o volume do comércio bilateral entre o Egito e a Turquia aumentou 14% em 2022, chegando a US$7,7 bilhões em comparação com os US$6,7 bilhões do ano anterior. Esses dados, divulgados pela Agência Central de Mobilização Pública e Estatística, indicam um fortalecimento das relações comerciais e um aumento nas trocas entre as duas nações. Para a Turquia, melhorar as relações com esses países e acabar com seu isolamento internacional é crucial para o seu crescimento econômico e a estabilidade, além de contribuir para a projeção da influência turca na região. O Egito, por sua vez, segue os passos dos países do Golfo, seus aliados, na restauração de relações diplomáticas com países regionais outrora antagonizados, como a Síria, a Turquia e o Catar.

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