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EUA e Austrália firmam acordo estratégico para conter domínio chinês sobre terras raras

  • dri2014
  • Nov 10
  • 4 min read
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A crescente importância das terras raras e dos minerais raros no campo tecnológico e de defesa não pode ser subestimada. Nesse cenário, os Estados Unidos têm enfrentado uma dependência estrutural da China, como analisado nessa reportagem, que há décadas domina não apenas a extração, mas sobretudo o refino, a separação química e a cadeia de processamento desses materiais, o que confere ao país um poder de barganha significativo.

A China, ao controlar uma grande parte da oferta global, pode influenciar preços, interromper exportações e impor condições às cadeias de valor ocidentais, transformando recursos minerais em alavancas estratégicas de poder geopolítico. Essa condição coloca os EUA em vulnerabilidade: para sustentar sua indústria de alta tecnologia, sua dissuasão militar e sua autonomia estratégica, Washington precisa garantir o acesso confiável a esses insumos e falhas nessa garantia podem comprometer tanto a competitividade econômica quanto a segurança nacional.

É justamente com esse pano de fundo que surge o novo marco de cooperação entre os EUA e a Austrália: o Acordo-quadro Estados Unidos e Austrália para Garantir o Abastecimento na Mineração e Processamento de Minerais Críticos e Terras Raras, assinado em 20 de outubro de 2025. Pelo acordo, os dois países comprometem-se a coordenar investimentos, reduzir entraves regulatórios, criar um “Grupo de Resposta à Segurança do Abastecimento”, e acelerar a mineração, separação e processamento de minerais críticos na Austrália, país que possui reservas consideráveis dessas matérias-primas e passará a se tornar um fornecedor estratégico dos EUA.

O investimento envolvido soma bilhões de dólares, com a expectativa de, no médio prazo, desbloquear uma cadeia de suprimentos prioritária e, no longo prazo, diminuir de forma significativa a dependência americana da China. Por exemplo, um relatório citou que depósitos no âmbito do acordo podem alcançar cerca de US$ 53 bilhões em minerais críticos.

No médio e longo prazos, esse acordo representa uma proposta de mitigação de vulnerabilidade: ele visa criar uma linha alternativa de abastecimento fora da órbita chinesa, fortalecer a base industrial de refino em países aliados, e permitir aos EUA maior autonomia na fabricação de componentes sensíveis. Ainda que especialistas advirtam que a dependência chinesa não será eliminada da noite para o dia — “não será um game-changer imediato” segundo uma análise recente.

Contudo, o fato de os EUA e Austrália estarem mobilizando mais de US$ 1 bilhão cada em projetos nos próximos seis meses, sinaliza que o impulso para a diversificação já está em curso.

No médio prazo, se bem executado, o paradigma de “fora da China” pode se consolidar como parte da estratégia ocidental de segurança industrial e tecnológica — reduzindo os riscos de interrupção de fornecimento, de coerção chinesa por meio de exportações e de vulnerabilidades geoestratégicas.

Essencialmente, trata-se de uma reforma estrutural das cadeias de suprimento de minerais críticos, alinhada à lógica de que, em situação de conflito ou de tensão elevada, quem controlar os materiais estratégicos terá vantagem decisiva. A aliança EUA-Austrália, portanto, não é apenas econômica, mas um instrumento de poder.

Se o projeto se cumprir, poderá alterar o equilíbrio competitivo global no setor de alta tecnologia, enfraquecer a alavancagem da China e conferir aos EUA um grau maior de segurança e independência. Contudo, o sucesso dependerá de fatores como rapidez na criação de capacidade de refino, regulações ambientais e logísticas eficazes, e da vontade política de manter investimentos de longo prazo.

Em última instância, esse acordo mostra que a competição tecnológica global está cada vez mais entrelaçada com o domínio dos recursos naturais e que, nesse jogo, terra e minerais raros podem definir a próxima fase da geopolítica.

Em um contexto mais amplo, o acordo também reforça o papel da Austrália como ator central no tabuleiro da segurança energética e mineral do Indo-Pacífico. O país, que já se consolidou como grande exportador de lítio e níquel, passa a integrar formalmente o eixo de contenção da influência chinesa na região, fortalecendo sua aliança militar com Washington e ampliando sua relevância diplomática. Essa parceria coloca a Austrália como contraponto estratégico à política chinesa de expansão mineral na África e na América Latina, regiões onde Pequim tem feito fortes investimentos em mineração e infraestrutura.

Ao mesmo tempo, o fortalecimento da cadeia produtiva ocidental pode estimular uma “corrida por soberania mineral” entre blocos, com implicações diretas sobre preços, sustentabilidade e acordos ambientais internacionais.

Por outro lado, o projeto levanta questionamentos ambientais e sociais relevantes. A mineração e o refino de terras raras são processos altamente poluentes, que demandam grandes quantidades de energia e produzem resíduos tóxicos. A pressão por acelerar a produção australiana pode gerar tensões internas, especialmente com comunidades locais e povos indígenas que habitam regiões ricas em recursos.

Nesse sentido, analistas defendem que o sucesso do acordo não deve ser medido apenas pela independência econômica em relação à China, mas também pela capacidade de estabelecer uma cadeia sustentável, responsável e transparente. Se conseguir equilibrar segurança estratégica, crescimento econômico e sustentabilidade ambiental, a parceria EUA–Austrália poderá servir de modelo para outras iniciativas de diversificação mineral em um mundo cada vez mais polarizado.

 
 
 

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