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O Motim Militar do Grupo Wagner



A Rússia tem passado por eventos políticos significativos no último ano, incluindo a Guerra da Ucrânia e, mais recentemente neste mês de junho, um motim militar e possível tentativa de golpe de Estado liderada pelo Grupo Wagner. O Grupo Wagner, coordenado por Yevgeny Prigozhin, entre outros, é uma organização paramilitar russa, descrita como sendo uma empresa militar privada com fortes ligações ao governo russo. O Grupo Wagner, financiado pelo governo russo, estava sendo utilizado como braço informal da Rússia para apoiar vários governos de países africanos. Com a eclosão do conflito armado na Ucrânia, o Grupo Wagner se expandiu militarmente e começou a ser empregado diretamente no território ucraniano, sob a direção do Estado-Maior russo.

Nos dias 24 e 25 de junho, um comboio do Grupo Wagner se dirigiu a cidade de Rostov-on-Don e ocupou a sede do Comando Militar do Sul. Um outro comboio se dirigiu na direção de Moscou. O líder do motim, Prigozhin, exigia a saída do Ministro da Defesa e do Chefe do Estado Maior encarregado das operações militares na Ucrânia. Se o Presidente Putin cedesse às reivindicações de Prigozhin, sua autoridade seria publicamente diminuída e toda a cadeia de comando militar ficaria afetada. Além disso, o envio de um contingente militar para Moscou, sinalizava uma tentativa de golpe de Estado e incitamento à guerra civil interna.

É importante notar que o incidente parece, na superfície, ter surgido repentinamente, mas, na realidade, vem se desenvolvendo há algum tempo. Há meses Prigozhin usava a mídia social para criticar duramente o Ministro da Defesa e seu Chefe de Estado Maior, preparando o terreno da opinião pública para o que faria a seguir. Em resposta, o Ministério da Defesa russo emitiu uma decisão exigindo que todos os grupos voluntários e empresas militares privadas, incluindo o Grupo Wagner, se submetessem inteiramente à estrutura de comando do Ministério da Defesa da Rússia, limitando, dessa forma, sua semi-independência. No entanto, o líder do Grupo Wagner anunciou que os seus integrantes não assinariam o contrato proposto, resultando em uma deterioração das relações entre o grupo e o governo russo. Diante desse impasse, o Ministério da Defesa passou a buscar maneiras de conter o Grupo Wagner, caso este se mostrasse desleal ou hostil em relação ao Estado russo.

Se é possível inferir, entretanto, que a motivação de Prigozhin para o motim pode ter surgido do cancelamento de contratos entre o Ministério da Defesa da Rússia com seus outros empreendimentos comerciais. Prigozhin tinha múltiplos interesses comerciais, e à medida que seus ganhos eram sufocados e o Grupo Wagner era forçado a assinar contratos com o Ministério da Defesa, sua independência e influência diminuíam. Também se sugere que Prigozhin tinha ambições políticas.

Os planos de Prigozhin e seus aliados fracassaram num espaço de 24 horas somente. O Presidente Putin fez um pronunciamento público denunciando o motim como ato de traição, mas separando os lideres dos membros da organização. No seu pronunciamento público, Putin apontou os riscos do motim para a estabilidade e segurança do país, lembrando as rebeliões militares durante a Primeira Guerra Mundial, que resultaram na derrota militar russa e na revolução russa. Todos os setores da sociedade russa se postaram ao lado do Presidente: os comandante militares, os políticos, os serviços de segurança, os executivos do complexo industrial-militar, a grande mídia, etc. No âmbito do Grupo Wagner, os oficiais não estiveram envolvidos na revolta em conjunto com Prigozhin, e estima-se que somente um quarto dos membros participaram do motim. Logo, Prigozhin viu que estava isolado.

O Grupo Wagner é uma organização que se acredita ter conexões com o Departamento Central de Inteligência russo (GRU, sigla do russo Glavnoye Razvedyvatel'noye Upravleniye), uma vez que seus principais originadores tinham vínculos com essa agência. Muitos acreditam que Utkin seja o verdadeiro fundador do Grupo Wagner, enquanto Prigozhin seria seu associado. Portanto, não surpreende que alguns líderes russos, como o deputado da Duma Federal e ex-general Andrey Gurulyov, estejam atribuindo a culpa apenas a Prigozhin e Utkin, considerando-os cúmplices e até mesmo defendendo a execução de ambos.

O fim do motim foi mediado pelo Presidente Lukashenko, de Belarus. Os detalhes da negociação não foram divulgados, mas sabe-se, no momento, que Prigozhin foi exilado para Belarus. Os membros do Grupo Wagner que não participaram do motim poderão integrar-se ao exército russo, voltar à vida civil, ou se instalar no território de Belaru; os equipamentos pesados de posse do Grupo (tanques, sistemas antiaéreos, artilharia) serão transferidos para o exercito russo; os contratos milionários do Grupo Wagner com o governo russo serão revisados; e os contratos das empresas de Prigozhin com o Estado russo serão extintos; o governo russo suspendeu a ação criminal aberta contra Prigozhin e concedeu anistia aos membros do Grupo que participaram do motim. No território de Belarus, o remanescente do Grupo Wagner vai treinar as forcas militares do país e atuar como dissuasor de potenciais ataques por partes de grupos armados de oposição que estão sendo treinados no território polonês.

Diante dessas circunstâncias delicadas no país, surgiram diversas teorias especulativas sobre possíveis envolvimentos de outras organizações estrangeiras com o Grupo Wagner, como a Agência Central de Inteligência dos Estados Unidos (CIA, sigla em inglês para Central Intelligence Agency) e o serviço de inteligência da Ucrânia. São complexas as dinâmicas e as motivações por trás dos eventos recentes envolvendo o Grupo Wagner e a tentativa de golpe de Prigozhin, lançando luz sobre as conexões entre o Grupo, os interesses comerciais de Prigozhin e suas ambições de poder. Em situações como essa, é essencial se informar por fontes confiáveis e aguardar por evidências concretas antes de formar opiniões definitivas sobre o envolvimento de organizações estrangeiras. A análise criteriosa dos fatos é fundamental para obter uma compreensão mais precisa da situação política na Rússia.

Por outro lado, também existem especulações sobre uma possível colaboração entre Prigozhin e Putin visando promover mudanças no comando russo. Essas especulações se baseiam em diversas conjecturas e teorias, mas é importante ressaltar que não há evidências concretas que comprovem o proposto. É compreensível que, dadas as conexões e a proximidade passadas entre Prigozhin e Putin, surjam teorias sobre uma possível aliança entre eles para influenciar o cenário político russo, mas se é crucial exercer cautela ao analisar essas alegações, uma vez que a política russa é complexa e envolve diversos atores e interesses. A reação pública de Putin ao motim, suas possíveis consequências militares e políticas, e as medidas tomadas para enfrentá-lo demonstram a implausibilidade dessa conjectura.

Ao final do motim, muitos analistas ocidentais apregoaram a debilidade do governo Putin, alegando que o motim demonstrou a presença de tensões e divisões graves no comando militar e na sociedade russas. No entanto, a reação dos comandantes militares, dos oficiais do próprio Grupo Wagner, e dos diversos setores da sociedade russa mostraram o inverso, isto é, uma unidade em defesa do país, da operação militar na Ucrânia, e da autoridade do seu presidente eleito. O motim foi debelado num curto espaço de tempo e de forma relativamente pacífica. A crise política temporária na Rússia não repercutiu no status do conflito militar na Ucrânia. Durante o breve motim, a Rússia lançou uma ofensiva diplomática para assegurar seus aliados de que estava no controle da situação, e obteve o apoio explícito de aliados importantes, como a China e a Índia, que condenaram o motim e mostraram solidariedade ao governo russo.


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