A Política europeia de redução de risco em relação à China
Recentemente, por meio de pronunciamento do Estado da União, a Presidente da União Europeia (UE), Ursula von der Leyen, apresentou os planos europeus com relação ao desenvolvimento sustentável e transição limpa, em resposta ao aumento da preocupação global com o cenário de mudanças climáticas, que vem ocorrendo ao longo dos últimos anos. Na oportunidade, além de apontar os grandes desafios econômicos do bloco, que estão relacionados à escassez de mão de obra e à elevada e persistente inflação, von der Leyen sinalizou as dificuldades de desenvolvimento de negócios que as empresas europeias vêm enfrentando, dado o cenário de concorrência desleal verificado no comércio internacional.
O principal argumento é de que empresas europeias estariam sendo excluídas dos mercados estrangeiros ou sendo vítimas de práticas predatórias, frente à concorrência com outras que se beneficiam de subsídios estatais. Segundo ela, esse seria o caso da indústria de carros elétricos chineses que, por meio dos subsídios, tem conseguido manter os preços desse tipo de veículo mais baratos que os produzidos em outros países. Nesse sentido, Ursula von der Leyen reforçou a importância de se fomentar apoio às empresas da região, apontando que a questão é de matéria econômica e de segurança nacional, visto ter relação com a preservação da vantagem europeia em tecnologias críticas e emergentes.
É nesse contexto de estrangulamentos externos que, em junho de 2023, o Conselho Europeu (CE) emitiu a decisão de reduzir o risco em relação à China, sem dissociar-se. A medida centra-se principalmente em reduzir a dependência europeia por matérias primas críticas chinesas - ou seja, reduzir o nível de tais importações do país asiático - e está resguardada pela Lei das Matérias-Primas Críticas, regulamentada em março de 2023. A estratégia está alinhada com a agenda proposta na Declaração de Versalhes - adotada em março de 2022 - como resposta da UE à Guerra da Ucrânia, incluindo: mecanismos para reforçar as capacidades de defesa do bloco; reduzir a dependência energética e de importações de certos produtos de importância crítica; e promover a construção de uma base econômica mais sólida.
No início de agosto, o Financial Times ressaltou o desafio que seria para a Europa reduzir os laços com um parceiro comercial tão importante como a China. Ao verificar alguns dados que demonstram a relevância da China para o comércio europeu, isto se torna cada vez mais visível: dados do Eurostat, por exemplo, expõem que o valor das importações europeias provenientes da China quase duplicou entre 2018 e 2022. No primeiro semestre de 2023, uma análise da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) relata a relevância da China em torno do fornecimento de bens, uma vez que o país é o principal fornecedor europeu. Isto mostra um certo fascínio, por parte dos países da Europa, com relação às empresas chinesas, em razão do seu potencial e tamanho, muito relevantes para o comércio europeu..
Essas negociações, em torno da redução de riscos adotadas pela União Europeia, teriam um grande custo substancial, como fora relatado por Belen Garijo, presidente-executivo da Merck. Sendo a globalização uma forma de expandir a inovação e cooperação ao redor do mundo, Garijo alerta sobre a possibilidade de perder essa oportunidade, em virtude das tensões entre a China e alguns países ocidentais. Vários outros líderes empresariais europeus também alertaram para os possíveis riscos provenientes dessa estratégia. Stefan Hartung, presidente do conselho de administração da Robert Bosch GmbH, afirmou que a Europa não poderia reduzir o risco ao se isolar. Na verdade, o que os países europeus deveriam fazer é investir cada vez mais no aumento da competitividade e ainda manter os negócios com a China. Dessa maneira, diversos líderes argumentam que a parceria entre a UE e a China é muito mais estratégica do que uma rivalidade sistêmica. Manter essa conexão poderia reforçar a cooperação entre os países, de modo a possibilitar o aumento de iniciativas em torno da segurança e do desenvolvimento global.
Atualmente, o continente europeu passa por uma crise política, geopolítica, econômica, climática e social, sem a presença de possíveis soluções para tais problemas. A Europa enfrenta um crescimento da desigualdade, um fracasso em travar as alterações climáticas e está com uma economia em ruínas, sem uma resolução à vista. Com a guerra na Ucrânia, a Europa tem assumido o encargo de financiar e lidar com o contexto e os impactos da guerra. Consequentemente, ou a Europa ficará sobrecarregada com uma nação destruída e disfuncional durante as próximas décadas, ou terá que abandonar a Ucrânia à sua sorte. A situação europeia só não está pior porque muitos governos e empresas europeias estão contornando as sanções, ou até mesmo ignorando-as. Além disso, ter a China como um de seus principais parceiros de exportação e investimento interno ajuda potencialmente a diminuir os efeitos das sanções contra a Rússia, demonstrando a importância chinesa para o mercado europeu.
Sendo assim, percebe-se que os planos europeus de eliminação de risco em relação à China afetam grandemente as empresas, bem como a economia dos países do próprio bloco econômico. Os desafios europeus frente à redução dos laços com um parceiro comercial tão importante como a China são enormes e poderão levar a um cenário de isolamento. Para evitar com que isso aconteça, seria imprescindível reforçar a cooperação entre os países, aumentar as iniciativas em torno da segurança e desenvolvimento globais, bem como a competitividade. Este cenário também possibilitaria reduzir as consequências provenientes das sanções impostas à Rússia e dos recursos econômicos investidos na Guerra da Ucrânia.
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