A Complexidade da Decisão de Retaliar
O gabinete de segurança israelense se reuniu na noite de quinta-feira, 10 de outubro de 2024, para discutir uma possível resposta ao ataque do Irã na semana passada. No entanto, nenhuma decisão importante foi tomada, já que a coordenação sobre o assunto continua entre Jerusalém e Washington, segundo um oficial israelense. “Não houve grandes decisões tomadas pelos ministros”, informou uma fonte israelense ao The Times of Israel, acrescentando que “há um desejo dos israelenses de coordenar com os americanos” sobre a resposta e que as discussões estratégicas continuam entre as partes. Os Estados Unidos são os principais fornecedores de armas e assistência financeira a Israel.
A região do Oriente Médio tem esperado ansiosamente uma represália israelense prometida ao ataque massivo sofrido com mísseis balísticos do Irã. Os Estados Unidos estão tentando coordenar e moderar a reação de Israel, que prometeu uma retaliação significativa. Entretanto, Biden, que determinou as forças dos EUA que ajudassem Israel a frustrar o ataque iraniano, expressou oposição a uma retaliação israelense dirigida contra os sites nucleares ou de produção de petróleo do Irã.
O gabinete do primeiro-ministro também informou ao The Times of Israel que a viagem de Gallant aos EUA para discutir a resposta de Israel ainda não foi aprovada, apesar das expectativas de que ele viajaria na próxima semana para discutir o assunto com o secretário de Defesa dos EUA, Lloyd Austin, no Pentágono. Netanyahu bloqueou a viagem planejada por Gallant a Washington no último minuto, exigindo primeiro falar com o presidente dos EUA, Joe Biden, sobre o que Israel pretende fazer contra o Irã
Em meio aos esforços de coordenação e as divergências, os EUA e Israel parecem estar na mesma página em relação aos desafios estratégicos no Oriente Médio. A ligação entre Netanyahu e Biden foi o culminar de discussões entre oficiais dos EUA e de Israel que vêm ocorrendo desde o ataque de 1º de outubro. A conversa foi descrita como “positiva” tanto pela Casa Branca quanto pelo gabinete do primeiro-ministro, apesar de o presidente dos EUA estar há muito tempo frustrado com a forma como Netanyahu tem lidado com a guerra em Gaza e, mais recentemente, com os combates no Líbano, lamentando a falta de uma estratégia claramente definida para encerrar os conflitos.
Um dos desafios de uma resposta agressiva é o potencial da nova resposta iraniana, que podem envolver outros países do Oriente Médio. Teerã ameaçou Estados árabes apoiados pelo Ocidente, afirmando que os atacará se uma ação retaliatória Israel-EUA contra o Irã passar pelo território ou espaço aéreo deles, informou o Wall Street Journal, citando oficiais árabes. As ameaças, descritas como vagas, foram transmitidas por canais secundários para Jordânia, Emirados Árabes Unidos, Arábia Saudita e Catar, levantando preocupações de que o Irã poderia atacar infraestruturas-chave de petróleo.
Os países, todos eles hospedando bases militares dos EUA, informaram Washington que não permitiriam que seu espaço aéreo ou instalações em seu território fossem usados para ação militar israelense ou americana contra o Irã. Profundamente alarmados com as ameaças de Israel, os Estados do Golfo estão fazendo lobby em Washington para impedir que Israel ataque os sites de petróleo do Irã, porque estão preocupados que suas próprias instalações de petróleo possam ser atacadas. Essa já foi uma realidade vivida na última década de conflitos regionais por procuração entre o eixo iraniano e a aliança dos países ocidentais e do Golfo. A Arábia Saudita, em particular, tem estado cautelosa com um ataque iraniano às suas instalações de petróleo desde um ataque em 2019 ao seu campo petrolífero Aramco pelos Houthis, que paralisou mais de 5% do fornecimento global de petróleo, a despeito de o Irã negar envolvimento.
Os sauditas estão tentando convencer os iranianos de sua neutralidade em meio a uma série de reuniões de alto nível. Recentemente, o presidente iraniano Masoud Pezeshkian visitou Doha, capital do Catar, para se encontrar com autoridades do Conselho de Cooperação do Golfo (CCG). Essas conversações continuaram na segunda semana de outubro, quando o príncipe herdeiro Mohammed bin Salman se reuniu com o ministro das Relações Exteriores do Irã, Abbs Araqchi, durante a turnê deste último pelo Golfo. A Reuters revelou mais detalhes em um relatório do dia 10 de outubro sobre os avisos preocupantes transmitidos pelo lado iraniano: “As iniciativas dos Estados do Golfo ocorrem após um esforço diplomático do Irã, país xiita não árabe, para persuadir seus vizinhos sunitas do Golfo a utilizarem sua influência junto a Washington, em meio a crescentes preocupações de que Israel possa atacar as instalações de produção de petróleo do Irã”. Em outras palavras, Teerã está pressionando os sauditas a convencerem Israel a recuar.
Uma complicação importante que coloca os sauditas em uma posição delicada em relação aos seus aliados é o fato de que os EUA possuem bases e tropas em seu território, incluindo ativos significativos da Força Aérea dos EUA. Washington já se comprometeu a ajudar os israelenses a repelir futuros contra-ataques com mísseis balísticos iranianos, como fez nas duas últimas rodadas de ataques com drones e mísseis balísticos lançados contra Israel. Uma guerra mais ampla entre o Irã e Israel certamente impulsionaria os EUA a pressionarem os sauditas e o CCG a permitirem que caças americanos baseados no Golfo enfrentassem o Irã. De acordo com a Reuters, o Irã ameaçou expressamente a Arábia Saudita com guerra caso ela coopere.
Nos últimos anos, sauditas e iranianos deram grandes passos em direção a uma reaproximação diplomática, enquanto a Arábia Saudita se afastava da normalização com Israel em razão da guerra em Gaza. Em termos de risco para o petróleo, considerando o caso da Saudi Aramco, se Israel atacar o suprimento do Irã, a OPEP tem capacidade ociosa de petróleo suficiente para compensar essa perda, mas não se os sites de petróleo da Arábia Saudita e dos Emirados Árabes Unidos forem atingidos por eventuais ataques de milicias xiitas.
Netanyahu e Biden estão em discussão lenta e cuidadosa, prezando por uma resposta efetiva e à altura em vez de uma retaliação rápida e impensada. Para que o conflito não escale de maneira arriscada, os países do Golfo devem ser tomados em consideração no centro dessa decisão. De toda forma, é importante compreender como, num mundo interdependente e complexo, um Estado, como Israel, sofre enormes pressões externas para limitar o exercício do seu direito de defesa e considerar os interesses de paises terceiros. Qual a medida da autonomia israelense quando se trata de sua própria segurança nacional?
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