Entendendo a Importância do que Acontece na Turquia – Parte I
A Turquia nasceu das cinzas do Império Otomano, um império que perdurou por mais de 6 séculos e foi a sede do Califado no mundo islâmico. Na sua maior extensão, o Império Otomano compreendia o Oriente Médio árabe, partes da península ibérica, os Balcãs, a Hungria, a Grécia, parte da Ucrânia, e chegou por duas vezes a cercar a cidade de Viena, capital da Áustria. Ao final da Primeira Guerra Mundial, o Império Otomano estava virtualmente extinto, sob ocupação das potências vitoriosas, e em virtude do Tratado de Sèvres, cedeu o controle de muitas províncias para as grandes potências europeias, particularmente o Reino Unido e a França, e perdeu territórios para a formação de novos Estados.
Uma guerra pela independência contra a ocupação estrangeira foi levada a cabo por forças nacionais turcas, sob a liderança de Mustafa Kemal Ataturk. A guerra de liberação nacional foi bem-sucedida, e Ataturk procedeu à extinção do Sultanato (1922) e, logo depois, do Califado (1924), criando a República da Turquia, um Estado secular. A tarefa de secularização do Estado não foi fácil, pois em 1923 ainda havia um Califa hereditário, as causas entre os cidadãos eram julgadas por cortes religiosas com base na Sharia (um código islâmico), homens e mulheres se vestiam e se portavam com base nesse código, o Islão era a religião oficial do Estado, e o tempo era medido pelo calendário islâmico. Ataturk e os seus kemalistas aboliram as cortes religiosas, e instituíram medidas destinadas a eliminar as forças de oposição ainda existentes nas forças armadas, na administração pública, nos grupos religiosos, e nas forças nacionalistas (Curdos), consolidando seu poder mediante o governo com base num único partido político (essa fase se deu entre 1924 e 1927). A Turquia vai evoluir politicamente até que em 1950 admite eleições multipartidárias.
A tradição kemalista sempre se amparou em duas colunas que sustentavam a laicidade do Estado turco: as forças armadas e o poder judiciário. Com a modernização e democratização da Turquia, uma imprensa autônoma e adepta dos princípios ocidentais e kemalistas se desenvolveu. A Turquia foi admitida na OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte) em 1952, e estabeleceu laços comercias fortes com a União Europeia (Acordo de Associação em 1963 e uma União Aduaneira em vigor desde 1996), desfrutando do status de candidato à membro da União Europeia desde 1999. Esse processo de Ocidentalização e modernização da Turquia será progressivamente estancado a partir de 2001, quando surge na cena política o Partido da Justiça e Desenvolvimento, sob a liderança de Recep Tayyip Erdogan, um ex-prefeito de Istambul.