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Turquia: fator de risco no Oriente Médio – Parte II


É verdade que a Turquia tem tido uma liberdade de ação sem precedentes na região? Era de se esperar que a Turquia teria sua autonomia de ação limitada pelos interesses dos Estados Unidos e outros aliados seus, mas isso não tem acontecido. Sua invasão e ocupação de parte do Iraque foi tratada pelos Estados Unidos como uma questão bilateral entre a Turquia e o Iraque, e os Estados Unidos se recusaram a condenar a Turquia, ao passo que a questão da Crimeia foi tida como ato de agressão e invasão, sujeitando a Rússia a imediatas sanções.

A manipulação, pela Turquia, do refugiados e migrantes em seu território também foi ignorada pelos americanos, e os europeus, principais vítimas do fluxo de refugiados, simplesmente se curvaram às pressões e demandas turcas.


Somente após as ações militares russas, que mostraram ao mundo a extensão do contrabando de petróleo por parte do Estado Islâmico via Turquia, resolveram os Estados Unidos atacar os comboios de transportes (não sem antes distribuir folhetos avisando dos ataques que viriam). Novamente, nenhuma palavra de reconhecimento ou condenação do envolvimento turco.


As ações militares da Turquia na Síria, particularmente contra os curdos (que lutam contra o Estado Islâmico) também não mereceram atenção ou condenação, nem tampouco a invasão do território sírio por forças militares turcas em várias ocasiões.

A espantosa derrubada de um bombardeio russo por caças turcos recebeu uma declaração do presidente Obama condenando a invasão do espaço aéreo turco, defendendo o direito da Turquia de defesa, e pedindo as partes que evitem o agravamento da crise. Isto a despeito de fundadas razões para classificar o ataque como premeditado e em violação das normas de direito internacional.

As flagrantes e repetidas violações de direitos humanos na Turquia têm ocupado apenas pequeno espaço em relatórios do Departamento de Estado norte-americano ou da Comissão Européia. Não se fala nem se cogita de sanções contra o governo turco.

A Turquia invadiu o Chipre em 1974 e instalou no norte do país uma república (República Turca do Chipre do Norte) que até hoje somente é reconhecido pela própria Turquia. A despeito disso, a Turquia não foi vítima de sanções internacionais.

O que justifica o tratamento diferenciado dado à Turquia? Esse país é membro da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte), possuindo o maior exército da organização depois dos Estados Unidos. O país situa-se num espaço geopolítico privilegiado, servindo de ponte para o Oriente Médio árabe, a Europa (Bálcãs), a África do Norte, o Cáucaso e a Ásia Ocidental. Seu território também controla os estreitos internacionais que ligam o Mar Negro ao Mar Mediterrâneo. A crise dos mísseis cubanos (1962), vale lembrar, começou como uma resposta do Premier Khrushchev ao estacionamento de mísseis nucleares americanos na Turquia, portanto, na fronteira sul da União Soviética. Por sua relevância geopolítica e estratégica, a Turquia pode esperar o apoio velado ou aberto dos Estados Unidos e aliados da OTAN mesmo quando comete graves erros estratégicos. No mesmo dia da derrubada do avião russo, por exemplo, a Turquia convocou uma reunião imediata extraordinária do Conselho da OTAN, correndo para debaixo do guarda-chuva militar da organização. A OTAN expediu um comunicado que claramente postou a organização ao lado da Turquia.

A ação provocou uma resposta russa imediata e indesejável: sanções contra a Turquia e o fortalecimento da missão militar russa na Síria, fechando o espaço aéreo sírio para os aviões militares turcos (que antes invadiam frequentemente esse espaço aéreo). Ao mesmo tempo, as recém-instaladas baterias aéreas russas colocam em risco os aviões aéreos americanos, franceses, britânicos e alemães que atuam na área (o que requereu um acordo de coordenação de ações com entre os russos e esses países ocidentais).

Não se duvida que algumas das ações turcas sejam efetuadas em coordenação prévia com os Estados Unidos, ou que a Turquia possa ser usada pela OTAN para os seus próprios fins, mas os Estados Unidos e seus aliados ocidentais precisam analisar o comportamento turco à luz dos objetivos expansionistas da sua instável e imprevisível política externa. O passe livre dado à Turquia revela a hipocrisia da política externa dos países membros da OTAN e ainda atraem a possibilidade de uma guerra nuclear.Eventualmente, o preço a pagar por um “aliado” como a Turquia é alto demais.

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