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O Levante dos Agricultores Europeus


Os protestos dos agricultores em toda a Europa têm se tornado cada vez mais proeminentes, atraindo considerável atenção dos ministros da Agricultura da União Europeia (UE). Apesar dos subsídios substanciais que recebem, os agricultores em todo o bloco estão expressando sua insatisfação com as políticas agrícolas, e esse descontentamento está ecoando em Bruxelas. As razões por trás da insatisfação variam consideravelmente de país para país. Na Alemanha, por exemplo, os agricultores estão preocupados com os planos de redução dos subsídios ao diesel, enquanto na Polônia e em outros países do Leste Europeu, as preocupações se concentram em bloquear estradas e fronteiras para evitar importações baratas da Ucrânia.

Diante desse contexto, a Copa-Cogeca, uma associação europeia de agricultores, tem clamado por regulamentações ambientais menos rigorosas, menos burocracia na política agrícola da UE e melhores condições para competir internacionalmente. Isso reflete uma demanda geral por mais exceções e menos regulamentações, indicando que os agricultores estão buscando um ambiente mais flexível para operar. Um exemplo do efeito de tais pressões foi a resposta dada pela presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, ao retirar uma proposta de lei que teria reduzido pela metade o uso de pesticidas na Europa. No entanto, muitos agricultores estão exigindo mudanças mais substanciais, buscando não apenas flexibilização das regras, mas também mais exceções para facilitar a obtenção de subsídios.

Com os protestos, o acordo negociado pela UE com os países do Mercosul (Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai) também fica afetado. Um texto final do acordo foi elaborado em 2019, mas não foi assinado ou ratificado por nenhuma das partes, até o momento. A Coordenação Europeia Via Campesina (CEVC) acredita que, caso entre em vigor, ele será um desastre para os criadores de gado europeus, pois levará ao aumento das importações de carne e de outros produtos dos países do Mercosul, causando uma baixa geral de preços e colocando ainda mais pressão econômica sobre os criadores de gado europeus. Sugere-se, também, que o acordo poderia resultar na importação de produtos que não cumprem os mesmos padrões rigorosos de segurança alimentar e sustentabilidade ambiental que a UE adotou.

A mudança estrutural na agricultura europeia também é um ponto de debate. Embora o número de explorações agrícolas tenha diminuído significativamente nas últimas décadas, a área cultivada permaneceu estável, indicando uma consolidação do setor. Os agricultores alemães, em particular, têm sido proeminentes nesse cenário de protestos. O plano do governo alemão de reduzir gradualmente os subsídios ao diesel agrícola foi o estopim que levou os agricultores e seus tratores às ruas para protestar. A burocracia excessiva, a confusão de exigências e regulamentações, assim como as constantes mudanças nas políticas, têm sido fontes de grande insatisfação entre os agricultores alemães.

Além da burocracia, os agricultores enfrentam desafios significativos em relação aos preços e à produção. A flutuação nos preços das commodities agrícolas, combinada com os custos crescentes de produção, coloca uma pressão adicional sobre os agricultores, muitos dos quais lutam para cobrir seus custos e garantir uma renda sustentável. A incerteza em relação ao futuro, com mudanças constantes nas regulamentações e políticas, torna ainda mais difícil o seu planejamento a longo prazo e o investimento em suas operações. Como resultado, muitos agricultores estão abandonando a atividade. Previsões indicam que o número de produtores agrícolas na Alemanha continuará diminuindo rapidamente, com os pequenos produtores sendo os mais afetados.

A pressão sobre os agricultores é reconhecida pelos líderes europeus, que enfatizam a necessidade de garantir a segurança alimentar, enquanto simplificam as políticas agrícolas. No entanto, mesmo com esses esforços, a aprovação da estratégia "do prado ao prato" pela Comissão Europeia, que traz novos regulamentos para as produções agrícolas, indica que ainda há desafios a superar na conciliação das demandas dos agricultores com as necessidades ambientais e de segurança alimentar.

Diante desse cenário de instabilidade, os ministros da União Europeia vêm tentando demonstrar atenção às demandas trazidas pelos fazendeiros e produtores europeus. Na última segunda-feira, 26/02/2024, eles se reuniram em Bruxelas, para examinar as propostas de simplificação da Política Agrícola Comum (PAC) do bloco e tentar acalmar as tensões e os protestos do movimento agrícola. A presidência da União Europeia, atualmente exercida pela Bélgica, também reconheceu a contribuição do peso do respeito pelas políticas ambientais,  a diminuição da ajuda do sistema de subsídios agrícolas do bloco, no que tange à insatisfação dos agricultores. "Ouvimos, claramente, as suas queixas", disse David Clarinval, ministro da agricultura da Bélgica, pedindo-lhes que se abstenham de violência.

Assim, a Comissão Europeia apresentou propostas que procuram flexibilizar algumas restrições ambientais impostas aos agricultores, incluindo tornar menos rígidas as exigências para que os antigos criadores de gado convertam as suas terras em pastagens. Ademais, a Comissão prevê a simplificação da administração e a alteração do modo de funcionamento das inspeções no local, numa tentativa de reduzir em 50% o número de visitas a que os agricultores são sujeitos. Poderá também ser concedida uma maior margem de manobra aos agricultores que, devido a fenômenos climáticos extremos, não cumpram os requisitos da PAC.

Em meio a essas dificuldades, muitos agricultores estão buscando uma voz mais forte na formulação de políticas agrícolas e uma maior consideração de suas preocupações por parte dos governos e autoridades da UE. Eles clamam por uma abordagem mais pragmática e sensível às realidades do setor agrícola, com menos burocracia e mais apoio para garantir a sustentabilidade e viabilidade das produções agrícolas. Os sindicatos de agricultores da CEVC, por exemplo, sustentam que as verdadeiras soluções para os agricultores europeus são políticas para regular os mercados e promover a soberania alimentar, em cooperação com os países do Sul, a fim de exigir um rendimento justo para todos os trabalhadores e políticas coerentes para responder à emergência climática global.

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